sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

Trilha de contradições


“Convencidos de que pensar dói e de que mudar é negativo, tateamos sozinhos no escuro, manada confusa subindo a escada rolante pelo lado errado”

“Viver é subir uma escada rolante pelo lado que desce.” Já escrevi sobre essa frase. Sim, repito alguns temas, que são parte do meu repertório, pois todo escritor, todo pintor, tem seus temas recorrentes. No alto dessa escada nos seduzem novidades e nos angustia o excesso de ofertas. Para baixo nos convocam a futilidade, o desalento ou o esquecimento nas drogas. Na dura obrigação de ser “felizes”, embora ninguém saiba o que isso significa, nossos enganos nos dirigem com mão firme numa trilha de contradições.





Ilustração Atômica Studio

Apregoa-se a liberdade, mas somos escravos de mil deveres. Oferecem-nos múltiplos bens, mas queremos mais. Em toda esquina novas atrações, e continuamos insatisfeitos. Desejamos permanência, e nos empenhamos em destruir. Nós nos consideramos modernos, mas sufocamos debaixo dos preconceitos, pois esta nossa sociedade, que se diz libertária, é um corredor com janelinhas de cela onde aprisionamos corpo e alma. A gente se imagina moderno, mas veste a camisa de força da ignorância e da alienação, na obrigação do “ter de”: ter de ser bonito, rico, famoso, animadíssimo, ter de aparecer – que canseira.

Como ficcionista, meu trabalho é inventar histórias; como colunista, é observar a realidade, ver o que fazemos e como somos. A maior parte de nós nasce e morre sem pensar em nenhuma das questões de que falei acima, ou sem jamais ouvir falar nelas. Questionar dá trabalho, é sem graça, e não adianta nada, pensamos. Tudo parece se resumir em nascer, trabalhar, arcar com dívidas financeiras e emocionais, lutar para se enquadrar em modelos absurdos que nos são impostos. Às vezes, pode-se produzir algo de positivo, como uma lavoura, uma família, uma refeição, um negócio honesto, uma cura, um bem para a comunidade, um gesto amigo.

Mas cadê tempo e disposição, se o tumulto bate à nossa porta, os desastres se acumulam – a crise e as crises, pouca trégua e nenhuma misericórdia. Angústias da nossa contraditória cultura: nunca cozinhar foi tão chique, nunca houve tantas delícias, mas comer é proibido, pois engorda ou aumenta o colesterol. Nunca se falou tanto em sexo, mas estamos desinteressados, exaustos demais, com medo de doenças. O jeito seria parar e refletir, reformular algumas coisas, deletar outras – criar novas, também. Mas, nessa corrida, parar para pensar é um luxo, um susto, uma excentricidade, quando devia ser coisa cotidiana como o café e o pão. Para alguns, a maioria talvez, refletir dá melancolia, ficar quieto é como estar doente, é incômodo, é chato: “Parar para pensar? Nem pensar! Se fizer isso eu desmorono”. Para que questionar a desordem e os males todos, para que sair da rotina e querer descobrir um sentido para a vida, até mesmo curtir o belo e o bom, que talvez existam? Pois, se for ilusão, a gente perdeu um precioso tempo com essa bobajada, e aí o ônibus passou, o bar fechou, a festa acabou, a mulher fugiu, o marido se matou, o filho… nem falar.

Então vamos ao nosso grande recurso: a bolsinha de medicamentos. A pílula para dormir e a outra para acordar, a pílula contra depressão (que nos tira a libido) e a outra para compensar isso (que nos rouba a naturalidade), e aquela que ninguém sabe para que serve, mas que todo mundo toma. Fingindo não estar nem aí, parecemos modernos e espertos, e queremos o máximo: que para alguns é enganar os outros; para estes, é grana e poder, beleza e prestígio; para aqueles, é delírio e esquecimento.

Para uns poucos, é realizar alguma coisa útil, ser honrado, apreciar a natureza, sentir o calor humano e partilhar afeto. Mas, em geral medicados, padronizados, desesperados, medíocres ou heroicos, amorosos ou perversos, nos achando o máximo ou nos sentindo um lixo, carregamos a mala da culpa e a mochila da ansiedade. Refletindo, veríamos que somos apenas humanos, e que nisso existe alguma grandeza. Mas, convencidos de que pensar dói e de que mudar é negativo, tateamos sozinhos no escuro, manada confusa subindo a escada rolante pelo lado errado.

Lya Luft é escritora e colunista da Revista Veja.

“A demagogia é a pior das mentiras, porque é uma mentira mentirosa.”TIM MAIA

quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

QUEREMOS O PISO! PISO PISO PISO...


762 milhões para ajudar a pagar o piso


Conforme o disposto na Lei nº 11.738, de 16 de julho de 2008, mais conhecida como a Lei do Piso do Magistério, a União pode auxiliar financeiramente estados e municípios que se encontrarem em reais dificuldades de pagar corretamente o piso salarial nacional para o magistério.

A Lei do Piso trata desta ajuda no seu artigo 4º:

Art. 4o A União deverá complementar, na forma e no limite do disposto no inciso VI do caput do art. 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias e em regulamento, a integralização de que trata o art. 3o desta Lei, nos casos em que o ente federativo, a partir da consideração dos recursos constitucionalmente vinculados à educação, não tenha disponibilidade orçamentária para cumprir o valor fixado.

§ 1o O ente federativo deverá justificar sua necessidade e incapacidade, enviando ao Ministério da Educação solicitação fundamentada, acompanhada de planilha de custos comprovando a necessidade da complementação de que trata o caput deste artigo.

§ 2o A União será responsável por cooperar tecnicamente com o ente federativo que não conseguir assegurar o pagamento do piso, de forma a assessorá-lo no planejamento e aperfeiçoamento da aplicação de seus recursos.

Uma leitura apurada do referido artigo demonstra que cabe a União regulamentar o formato desta ajuda, mas deve “partir da consideração dos recursos constitucionalmente vinculados à educação” do ente federado solicitante da ajuda. Este deve enviar solicitação fundamentada, acompanhada de planilha de custos comprovando a necessidade da complementação.

Foram reservados 10% dos recursos que a União obrigatoriamente deve aplicar em complementação ao Fundeb para esta finalidade, ou seja, estão reservados 762 milhões para esta tarefa.

Amanhã comentarei o teor da Portaria nº 484, de 23 de maio do ano passado, que legalizou as normas definidas para este processo pela Comissão Intergovernamental de Financiamento para a Educação Básica de Qualidade.

Postado por Luiz Araújo

quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

Fundeb em 2010

Os números oficiais publicados no dia 28 de dezembro configuram um fundeb para 2010 com as seguintes características: O montante de recursos que estão previstos para circular nos fundos estaduais será de 83 bilhões 095 milhões de reais. Deste montante a União entrará com 6 bilhões 861 milhões. Apesar de que 10% do montante depositado pelos estados e municípios ser de 76,2 bilhões, o que levaria a obrigar a União depositar para a complementação 7,62 bilhões, a legislação permite que até 10% deste recurso seja utilizado para financiar projetos nacionais e para ser utilizado no auxilio a estados e municípios que comprovarem a impossibilidade de pagar o piso salarial nacional para o magistério.
Assim, foram reservados 762 milhões para estas tarefas, valor descontado do recurso destinado a complementação da União.
Com isso, o valor mínimo por aluno que estava previsto pela própria União de ser R$ 1443,63 caiu para R$ 1415,97. Este valor representa uma correção de 16% sobre o valor previsto para 2009.
Serão nove fundos estaduais beneficiados com recursos da complementação (Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Maranhão, Pará, Paraíba, Pernambuco e Piauí). O estado do Rio Grande do Norte chegou a ser computado no documento enviado pelo governo junto com a Proposta de Lei Orçamentária para 2010, mas refeitos os cálculos este estado deixou de merecer complementação.
A União repassará 85% do valor previsto até dezembro e os 15% restantes em janeiro de 2011.
O maior valor por aluno é do estado de Roraima (R$ 2.666,53), seguido por São Paulo (R$ 2.318,75) e Distrito Federal (R$ 2.166,84).

Postado por Luiz Araújo

terça-feira, 26 de janeiro de 2010

O mundo é um lugar perigoso de se viver, não por causa daqueles que fazem o mal, mas sim por causa daqueles que observam e deixam o mal acontecer.

Albert Einstein


Erro ou esperteza?

No dia 28 de dezembro de 2009 o governo federal publicou a Portaria n° 1227, que estabeleceu os valores previstos de arrecadação no FUNDEB, assim como o montante de recursos destinados pela União para a Complementação aos estados e municípios. Alguns números são bastante intrigantes.
Em agosto de 2009 o governo federal editou a Portaria n° 788, que revisou a estimativa de receita dos estados e municípios, medida provocada pelo impacto da crise econômica mundial na arrecadação da União, dos estados e dos municípios. A estimativa de receitas, sem levar em conta a complementação da
União, apontava para 76,8 bilhões de reais.

A projeção apresentada para 2010, tendo a crise econômica mundial arrefecido nos seus efeitos sobre a arrecadação, indica um volume de apenas 76,2 bilhões, ou seja, uma redução de 0,8% em relação a previsão de 2009.

O anexo I da referida Portaria mostra que o governo federal projeta queda de arrecadação em 18 estados brasileiros, sendo o caso mais grave o Espírito Santo, onde a projeção aponta uma queda de 13,5%.

Diante destes números oficiais é razoável se trabalhar com pelo menos três hipóteses:

1ª. A crise econômica vai continuar, contrariando tudo que o governo anda falando e haverá uma repetição do péssimo desempenho de 2009;

2ª. Inadvertidamente os técnicos do governo erraram as estimativas; e

3ª. O governo decidiu subestimar o crescimento da arrecadação estadual e municipal, conseguindo com isso diminuir o montante de recursos federais destinados a complementação do fundo, os quais devem ser 10% do montante depositado por estados e municípios no FUNDEB.

Torço para que a resposta não seja a primeira alternativa, pois 2009 foi um ano de dificuldades para a educação brasileira, a qual não recebeu as compensações que o empresariado generosamente teve por parte do governo federal.

Não acredito que técnicos bens formados e com acesso aos dados estaduais e municipais tenham cometido um erro de cálculo.

Só nos resta a terceira alternativa. Caso tenha sido isso, merecerá das entidades representativas dos gestores estaduais e municipais e dos sindicatos representativos dos trabalhadores em educação uma mobilização imediata para reverter esta esperteza governamental.

Postado por Luiz Araújo


O PISO DOS PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO NO BRASIL

 Mais uma Verdade Parcial e uma Mentira Total em 2010.



domingo, 24 de janeiro de 2010

PENSE NISSO!!!

"Educação nunca foi despesa. Sempre foi investimento com retorno garantido".

Sir Arthur Lewis

CÂMARA APROVA PISO SALARIAL DOS PROFESSORES

Agora é lei. Os vereadores aprovaram  o Plano de Cargos, Carreira e Remuneração do Magistério Público Municipal de Alto do Rodrigues, que objetiva a valorização e a qualificação dos profissionais, associado à melhoria dos serviços educacionais prestados à população. O Plano aprovado foi mais uma conquista da categoria que através de representantes do Poder Executivo, da Secretaria de Educação e do Sindicato, tiveram uma comissão de reestruturação competente e responsavel. Muitos professores estiveram na Câmara para presenciar a sessão. O Projeto de Lei n°. 433/2009, que institui o plano foi aprovado por unanimidade, todos os veradores da casa estavam presentes e votaram a favor da aprovação. O Plano será enviado à prefeitura para sansão do Prefeito Eider Medeiros. É a gestão Fazendo Acontecer valorizando a educação e reconhecendo o trabalho do educador. O novo piso dos professores com a aplicação do percentual determinado pelo governo federal foi elevado para R$ 1.024,67 para uma jornada de 40 horas semanais. A Secretaria de Educação adota uma jornada de trabalho de 30 horas semanais, mesmo assim os cálculos foram feitos em cima desse novo valor, beneficiando todo magistério. Os vereadores presentes concordaram com o texto do plano apresentado, inclusive com a tabela de vencimentos dos professores.

Parabenizo a Secretária de Educação Raquel Viana e toda sua equipe.

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Valores e aprendizados não tiram férias

Por Içami Tiba
Os filhos não podem fazer nas férias o que não poderiam fazer em um final de semana, em uma viagem, em
qualquer lugar, com qualquer pessoa, principalmente no que se referem aos valores, como respeitar o próximo e fazer-se respeitar por ele, cumprir as regras sociais e familiares, cuidar e preservar a saúde e a segurança, praticar a cidadania familiar etc.
O que tira férias são as frequências às aulas, com os seus conteúdos e deveres psicopedagógicos, juntamente com o relacionamento professor-aluno, e não o viver com qualidade e o constante aprendizado da vida para sermos pessoas de "alta performance".
Mesmo chocando uns, há outros pais que querem tirar férias dos filhos pequenos porque precisam descansar, descontrair, fazer uma viagem, dar um tempo na rotina profissional e até mesmo dos filhos que não lhes dão sossego. Adultos quando chegam aos lares querem paz, e, crianças, querem pais. Todavia, não seria de se estranhar se estes filhos quisessem "se ver livres" destes pais cansados e também tão cansativos.
Adultos há que se permitem fazer em viagens, na praia, no clube ou quando estão de passagem em algum lugar o que não fariam em casa: jogar papel na sala, atirar pela janela latas e garrafas de bebidas (cascas de frutas, sacos de papel) no seu próprio jardim, deixar banheiro sujo, cuspir no tapete, fazer as necessidades nos cantos dos quartos etc. Estes adultos não estão tirando férias da sua casa, mas dando férias à educação e à civilidade. Importantes valores devem acompanhar as pessoas como se fossem a própria alma estejam onde e com quem estiverem.
Estes pais estão financiando a falta de educação, o desrespeito ao próximo, a depredação e o uso pirata do seu mundo e a negligência com os deveres sociais aos seus filhos.
Portanto, é na convivência com os filhos que os pais mostram como se comportar civilizadamente em qualquer lugar. Reforço aqui a importância da prática doméstica da educação pela cidadania familiar: ninguém pode fazer em casa o que não poderá fazer fora de casa e todos devem praticar em casa o que deverão fazer na sociedade.
A cidadania familiar nunca tira férias. Mesmo que um filho esteja de férias, longe dos pais, ele não deve fazer o que aprendeu em casa que não pode fazer: experimentar drogas é um exemplo.

Içami Tiba é psiquiatra e educador. Escreveu "Família de Alta Performance", "Quem Ama, Educa!" e mais 25 livros.

sábado, 9 de janeiro de 2010

o Lobo e a sua Sombra


Um Lobo saiu de sua toca num fim de tarde, bem disposto e com grande apetite. E enquanto ele corria, a luz do sol poente batia sobre seu corpo, fazendo sua sombra aparecer refletida no chão.

Então ele viu aquela sombra de si mesmo projetada no chão. E como a sombra de uma coisa é sempre bem maior que a própria coisa, ao ver aquilo, exclamou vaidoso: “Ora, ora, veja só o quanto grande eu sou! Imagine eu, com todo esse tamanho, e ainda tendo que fugir de um insignificante Leão! Eu o mostrarei, quando o encontrar, se Ele ou Eu, afinal, quem de verdade é o rei dos animais!”

E enquanto estava distraido envolto em seus pensamentos e gabando a si mesmo, um Leão pulou sobre ele e o capturou.
Ele então exclamou com tardio arrependimento: “Coitado de mim! Minha exagerada autoestima foi a causa da minha perdição.”

Moral da História:
Não permita que suas fantasias o façam esquecer da realidade.
Autor: Esopo
http://www.sitededicas.com.br

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

O ano de pensar



"A essência seria esta: neste ano, eu vou pensar. Em mim, na vida,
nos outros, no mundo, em mil coisas ou numa coisa só – que seja
realmente importante"
Mudança de ano, que, com o Natal, para uns é celebração (estou desse lado), para outros, melancolia.

O que nos atrapalha é que alguém inventou que temos de tomar decisões e fazer projetos para esse novo ano. São quase sempre irreais, quase sempre não cumpridos. Aí já nos frustramos neste mundo de tantas frustrações, em que a gente teria de ser bonito, saudável, competitivo e competente, bom de cama e ruim de mesa, e uma lista interminável de "ter de".

Pois eu acho que 2010 pode ser o Ano de Pensar. Bom projeto, boa intenção. Uma só, e já é bastante. Pensar: coisa que tão pouco fazemos, embora seja o que nos distingue das outras feras.Publiquei recentemente mais um livro para crianças (mas os adultos se divertem), chamado Criança Pensa. Com ele respondi, décadas depois, ao duplo lema dos adultos de um outro tempo, de que criança não pensa, criança não tem querer. Hoje tem querer até demais, mas isso é assunto para outra crônica. E pensar, continua pensando, apesar de todos os jogos eletrônicos e programas de computador imagináveis.

Se criança pensa – e pensa lindamente, segundo descobrimos e escrevemos, um de meus filhos, professor de filosofia, e eu –, adultos teriam de pensar ainda muito mais. Porém a gente vai se enquadrando. Família, escola, sociedade e cultura, seja o que isso for, tornam-nos menos pensantes e menos questionadores. Alguns escapam dessa mordaça e desabrocham. Podem ser os menos confortáveis, mas são os que movem o mundo.

Pensar não é uma obrigação: é um direito, e deveria ser um prazer. Naquela horinha no ônibus ou no carro, andando, nadando, comendo, não fazendo nada – o que é um luxo, e nós, bobos, poucos saboreamos –, nada melhor do que deixar tudo de lado e refletir, ou deixar as ideias vagando numa atenção flutuante, como dizia Freud. Largar mão, por alguns instantes, dos compromissos, do cansaço, da falta de tempo, da dificuldade em ser feliz, da pouca harmonia consigo e com o mundo, das tragédias, das decepções universais ou pessoais – e dar-se o prêmio de pensar. Para algumas pessoas, parar para pensar não é desmontar.

E ficariam dispensados os dez ou doze ou três propósitos, as intenções fajutas eternamente repetidas – como as de emagrecer, romper ou melhorar o relacionamento, sair de casa, voltar a estudar, vencer na vida, ter filhos, mudar de emprego ou de parceiro, deixar de beber, de fumar, de se drogar com outras substâncias. A essência seria esta: neste ano, eu vou pensar. Em mim, na vida, nos outros, no mundo, em mil coisas ou numa coisa só – que seja realmente importante.

Pensar para ser uma pessoa mais decente; pensar para amar mais e melhor, começando por mim mesmo; pensar para votar com mais lucidez; pensar no que de verdade eu quero, se é que eu quero alguma coisa – ou sou do tipo que se deixa levar por desânimo, preguiça ou desencanto?

Pensar simplesmente para criar meu mundo particular, não num ataque de loucura, mas de criatividade. Pois o real não existe, existe o que vemos dele. Dentro de certos limites, podemos, cada um de nós, inventar o nosso mundo: sendo mais céticos ou mais otimistas, com aquele grãozinho de loucura necessário para que haja beleza e claridade e não vivamos numa caverna de trevas.

Basta ver como pensam as crianças, ainda livres das nossas inibições. "Fadas e anjos existem, não é?", pergunta-me uma delas. Respondo honestamente: "Para quem acredita, existem". Acredito que, apesar de Copenhague, o mundo não vai torrar (as opiniões dos cientistas divergem), que vamos ter motivo para nos orgulhar de nossos países, que não vai mais haver tanta miséria e cinismo, que os colégios vão ensinar melhor e exigir mais em lugar de facilitar tão absurdamente e despejar tanta gente despreparada no mundo.

Sei que todos algum dia acordamos com a senhora desilusão sentada na beira da cama. Mas a gente vai à luta e inventa um novo sonho, uma esperança, mesmo recauchutada: vale tudo menos chorar tempo demais. Pois sempre há coisas boas para pensar. Algumas se realizam. Criança sabe disso. Feliz 2010.
Lya Luft é escritora